Minha
querida avó, não morras.
Preciso
da tua capacidade de me adivinhar a verdade para lá do sorriso que te dou. Tu
sabes sempre dentro de ti quando não estou assim tão bem como parece.
Todos
precisamos dessa intuição na família. E insistes em falar da tua morte, do
dinheiro para o teu funeral, do coração que umas vezes te bate com demasiada
intensidade e que não sabes se é um sinal de aproximação desse dia. Que não
aceito que esteja para chegar.
Fazemos
assim: estás longe e quase sempre me escondem como te sentes para não me
martirizar. Já sei como é. Só sei que estás internada se ligar duas vezes
seguidas e não me atenderes. Aí as tuas queridas filhas começam a inventar
desculpas. Então fazemos assim: não me mentes. Mas avisas-me se o coração em
vez de bater muito, começar a bater pouco. Enquanto bate muito é essa tua força
a dizer que ainda queres estar cá entre nós, que o avô pode esperar mais um
pouco. Ai de ti que não me avises. E pára de viver só para os nossos problemas.
Sabes que também temos alegrias? Sabes que tens uma família com discussões
tipicamente mediterrâneas mas cheia de amor entre si? Sabes que as
tuas filhas, netas e bisnetos - todos - conseguem sorrir apesar das
adversidades? Sabes, sim. E recusas partilhar a nossa alegria quase sempre
porque te debates com os nossos problemas. Aqueles que não te contamos mas que
tu desvendas mesmo sem saberes ler nem escrever devidamente.
Por isso avó, alegra-te quando eu te visitar de surpresa e
não desates a chorar porque eu devia ter-te dito que ia, porque não tens
frangos dos teus na arca para eu trazer e que nem ovos nem batatas nem cebolas
nem não sei mais o quê que me dás e que é tão bom. Para além dos teus
abraços.
Alice
Sem comentários:
Enviar um comentário